Desvendando a Corrosão Sob Isolamento (CUI): Uma Perspectiva Essencial para Engenheiros
Introdução
A corrosão é um desafio onipresente na indústria, custando à economia global estimados US$ 2,2 trilhões anualmente. Desse montante, cerca de 45% – aproximadamente US$ 1 trilhão – incide sobre os setores de óleo, gás e petroquímica, afetando tanto operações terrestres quanto offshore. Dentro desse contexto, a Corrosão Sob Isolamento (CUI) emerge como uma questão crítica amplamente reconhecida pelos operadores de plantas industriais. Estima-se que a CUI seja responsável por 40-60% dos custos de manutenção de tubulações e 10% dos custos anuais totais de manutenção nessas indústrias, dedicados à reparação de danos causados por ela. Casos severos de CUI podem comprometer a segurança do pessoal, o meio ambiente e a reputação da indústria.
Apesar da conscientização sobre os números e os riscos, pouca pesquisa se dedica aos melhores métodos de prevenção da CUI para prolongar a vida útil das tubulações e otimizar a segurança. Embora o isolamento seja primariamente instalado para conservação de calor/frio, proteção contra geada, controle de processo, proteção pessoal, controle de ruído, controle de condensação ou proteção contra incêndio, sua influência potencial no risco de CUI é frequentemente subestimada ou avaliada de forma limitada. Este artigo técnico propõe uma abordagem holística para o projeto de sistemas de isolamento, visando a redução do risco de CUI em tubulações industriais, considerando não apenas os materiais de isolamento, mas todo o sistema aplicado.
Desenvolvimento
O Que é Corrosão e CUI?
A corrosão é um processo eletroquímico que ocorre quando a água se combina com o oxigênio em uma superfície metálica. A CUI, por sua vez, é qualquer tipo de corrosão que acontece na tubulação devido à presença de umidade dentro ou sob o sistema de isolamento. É especialmente prevalente no setor de óleo e gás, onde a tubulação de aço é extensivamente utilizada e as instalações tendem a estar em regiões geograficamente propícias à CUI, como ambientes marinhos, offshore, quentes/úmidos e com alta pluviosidade.
Diversos fatores influenciam o desenvolvimento da CUI:
- Água e Umidade: A presença de água ou umidade é fundamental para a CUI em aço carbono ou de baixa liga. A entrada de água líquida pode ocorrer por chuva, sistemas de dilúvio, derramamento de líquidos de processo ou condensação, penetrando por falhas no revestimento ou devido à sua deterioração. Materiais de isolamento porosos podem ficar saturados, o que, além da corrosão, pode levar à perda de desempenho térmico/acústico. A difusão de vapor d’água também é um fenômeno importante, onde moléculas de água na atmosfera migram para a superfície da tubulação quando as temperaturas de serviço estão abaixo do ambiente.
- Temperatura: O risco de CUI em aço carbono aumenta na faixa de temperatura logo abaixo do ponto de congelamento da água até 175 ºC. Organizações como NACE, CINI e API concordam que o risco é elevado entre 50 ºC e 175 ºC, sendo especialmente crítico entre 77 ºC e 110 ºC. A taxa máxima de corrosão para aço carbono na presença de água aerada pode atingir 0,5 mm/ano a 80 ºC. Condições de temperatura cíclica são ainda mais desafiadoras, pois promovem a entrada regular de vapor d’água no sistema durante fases frias e o acúmulo de sais e íons corrosivos na superfície do tubo quando a água evapora nas fases de alta temperatura.
- Contaminantes: Materiais de isolamento podem conter cloretos e fluoretos que contribuem para a corrosão quando depositados e concentrados na superfície da tubulação. A presença de íons lixiviáveis é uma preocupação particular para o stress corrosion cracking externo (ESCC) em aços inoxidáveis austeníticos. No entanto, uma fonte ainda mais significativa de íons corrosivos pode ser o ambiente em que os materiais são instalados, especialmente em regiões offshore ou costeiras.
O papel do isolamento no desenvolvimento da CUI é triplo: ele proporciona um espaço anular ou fresta para a retenção de água e agentes corrosivos, um mecanismo para a absorção e propagação da umidade por “capilaridade” (wicking), e pode contribuir com contaminantes (como cloretos lixiviáveis) para acelerar a corrosão. As características dos materiais de isolamento que mais influenciam a CUI incluem a natureza de célula fechada ou aberta (porosa), absorção de água, permeabilidade e retenção, capilaridade, níveis de cloretos lixiviáveis e a escolha do revestimento.
Prevenção da CUI: Uma Abordagem de Sistemas
Embora o isolamento por si só não possa proteger os componentes da planta contra a corrosão, sistemas de isolamento adequados podem apoiar efetivamente a mitigação da corrosão. A escolha do sistema de isolamento determina se ele resistirá à entrada de água ou vapor d’água e minimizará o risco de corrosão, ou se permitirá ou até acelerará os processos corrosivos.
A prevenção da CUI deve ser encarada sob uma perspectiva de “linhas de defesa”. Considera-se que existem cinco linhas de defesa para mitigar a CUI:
- Tipo e grau do aço (tubulação/vaso).
- Revestimento protetivo.
- Camadas de isolamento.
- Barreira de vapor.
- Revestimento externo/jaqueta.
A figura 2 do documento original ilustra a integração dessas linhas de defesa. Cada uma delas possui limites de desempenho e é suscetível a erros de projeto e aplicação, sendo este último o desafio mais significativo.
O revestimento externo/jaqueta é a primeira linha de defesa contra a entrada de água, diretamente exposta às condições ambientais. Falhas na instalação ou danos podem comprometer essa barreira. A barreira de vapor atua como uma segunda linha de defesa para sistemas de isolamento a frio/criogênicos, protegendo contra a transmissão de vapor d’água, mas também pode ser danificada durante a aplicação. A camada de isolamento é a terceira linha de defesa, e seu foco está na capacidade inerente do material de resistir à entrada e propagação de água ou vapor d’água e sua retenção. Materiais com alta resistência à entrada de água e vapor d’água atrasarão o tempo necessário para a água atingir a superfície do tubo, retardando a iniciação e propagação da corrosão.
Métodos de Avaliação Existentes e Suas Limitações: Muitos dos padrões de teste usados para avaliar o comportamento de materiais de isolamento (como ASTM C871, EN 13468, ASTM C795, ASTM C692, ASTM C1617, ASTM G189) são considerados imprecisos ao reproduzir falhas reais. Eles frequentemente assumem a falha do isolamento ou revestimento, comprometendo a avaliação dos benefícios de certos tipos de isolamento. Uma avaliação adequada requer uma abordagem de teste baseada em sistemas, que permita apreciar e avaliar as diferenças entre materiais de célula fechada e célula aberta, hidrofóbicos e não hidrofóbicos, rígidos e flexíveis, aderidos e não aderidos.
Modos de Falha e Vulnerabilidades: Uma solução única para todos os desafios de CUI é irrealista. A indústria está aprendendo que é preciso uma combinação de tecnologias de materiais e revestimentos para abordar as diversas formas pelas quais a CUI pode ocorrer. Os modos de falha mais comuns para a entrada de água ou vapor d’água no isolamento incluem: revestimento/jaqueta danificado ou mal aplicado, barreira de vapor danificada ou mal aplicada, isolamento danificado ou mal aplicado (especialmente em juntas e protuberâncias), projeto inadequado do sistema de isolamento e má aplicação geral e falta de inspeção. Pontos particularmente vulneráveis incluem protuberâncias (válvulas, suportes, bicos, etc.), suportes de tubulação (sapatas, abraçadeiras) e terminações.
Matriz de Risco Simplificada: Uma forma de avaliar o benefício do isolamento em relação à CUI é classificar seu desempenho contra riscos específicos. Isso pode ser feito revisando o comportamento dos materiais em relação a procedimentos de medição padrão e testes projetados para avaliar modos de falha específicos. Para um material de isolamento poroso e não hidrofóbico, como algumas lãs minerais não tratadas, a proteção contra a entrada de água líquida é muito limitada. Materiais de célula fechada (como espuma elastomérica flexível – FEF, ou vidro celular) ou hidrofóbicos (como aerogéis) geralmente possuem forte capacidade inerente para restringir a entrada de água líquida, oferecendo maior proteção contra CUI. A Tabela 2 do documento original apresenta o desempenho de materiais de isolamento comuns em relação ao risco de CUI, como função da temperatura de serviço, fase da água e comportamento de entrada e retenção de água.
Características dos Materiais de Isolamento e Seus Benefícios:
- Redução da Entrada de Água: Materiais de célula fechada (FEF, vidro celular) ou hidrofóbicos (aerogéis, algumas lãs minerais) oferecem alta resistência à entrada de água em fase líquida e vapor. Materiais de célula aberta ou porosos, não hidrofóbicos, são suscetíveis à penetração de água por ação capilar (wicking) se a jaqueta externa ou barreira de vapor for comprometida.
- Redução da Retenção de Água: Embora materiais de célula fechada e hidrofóbicos ofereçam boa resistência à entrada de água, muitos deles também são bons em reter água, o que levará à CUI a longo prazo se não for tratada. Para altas temperaturas, a água pode evaporar por meio da camada de isolamento. Para baixas ou moderadas temperaturas (< 80 °C), são necessárias medidas adicionais para que a água retida possa escapar, como furos de drenagem.
- Espaço Anular: Espaços anulares entre o isolamento e a superfície do tubo criam pontos de coleta de água. Isso é comum com materiais isolantes rígidos, independentemente de serem de célula aberta ou fechada. O efeito de menisco tende a reter a água. Isolamentos flexíveis, como aerogéis e FEF, são projetados para um ajuste mais próximo à tubulação, reduzindo a possibilidade de espaços anulares.
- Redução da Propagação da Água: Materiais de célula aberta ou porosos facilitam a propagação da água por capilaridade. A forma como os materiais são fixados e as juntas são seladas também é crucial. Materiais de célula aberta são frequentemente fixados mecanicamente com juntas raramente seladas. Para isolamentos rígidos, mastiques ou calafetadores são usados para preencher as lacunas. Em isolamentos de FEF, adesivos de contato compatíveis e ajuste por compressão permitem que as seções sejam unidas sem lacunas, criando uma camada contínua. O sobreposição de múltiplas camadas e o escalonamento das juntas também criam um caminho tortuoso para a água, reduzindo a penetração.
Boas Práticas de Gestão da CUI
A forma como um sistema de isolamento é instalado é de importância crítica. Mesmo os melhores sistemas podem ser comprometidos por uma aplicação inadequada.
- Instruções de Instalação: Os instaladores devem seguir as instruções e orientações do fabricante. Para sistemas complexos, isso pode exigir procedimentos separados para cada componente. Os fabricantes devem fornecer orientação para áreas vulneráveis onde há quebra na continuidade do sistema.
- Qualificação e Treinamento: A falta de pessoal treinado para aplicar materiais de isolamento levará a um risco significativo de que as instruções não sejam seguidas, comprometendo a instalação. É fundamental que os instaladores recebam treinamento adicional para se familiarizarem com as tecnologias de materiais específicas do projeto. Empresas líderes do setor de óleo e gás estão tornando o treinamento e o suporte no local um requisito obrigatório em novas especificações de isolamento, aumentando a confiança na instalação correta do sistema.
- Inspeção e Manutenção: Um bom programa de inspeção e manutenção deve focar nas áreas mais vulneráveis à CUI. A inspeção começa na fase de construção, seguindo Planos de Inspeção e Teste (ITP’s). Após a conclusão dos sistemas, é importante realizar inspeções e manutenções regulares e rotineiras, mesmo antes da partida da planta. Considerações para uma inspeção visual básica incluem a condição da jaqueta e juntas, perfurações, lacunas, amassados, isolamento esmagado, evidência de gelo, condensação ou superaquecimento, e isolamento removido e não reinstalado. Embora existam tecnologias não invasivas (infravermelho, micro-ondas, ultrassom), inspeções invasivas podem ser necessárias. Os materiais de isolamento FEF facilitam a inspeção e manutenção, permitindo a remoção apenas do material relacionado à área afetada, já que restringem dramaticamente a propagação da água e da corrosão após uma violação do sistema.
Conclusão
A Corrosão Sob Isolamento (CUI) representa um desafio oneroso e de alto risco para a indústria, especialmente nos setores de óleo, gás e petroquímica. A compreensão aprofundada dos fatores que influenciam a CUI – como a presença de água/umidade, as faixas críticas de temperatura e a presença de contaminantes – é fundamental para engenheiros de diversas especialidades.
É inegável que o tipo e o projeto dos materiais de isolamento desempenham um papel muito mais importante na mitigação da CUI do que se reconhecia anteriormente. A adoção de uma abordagem de sistemas, que considera as cinco linhas de defesa – o tipo de aço, o revestimento protetivo, as camadas de isolamento, a barreira de vapor e o revestimento externo – é essencial para construir estratégias mais robustas contra a corrosão. As limitações dos métodos de teste existentes ressaltam a necessidade de uma avaliação baseada no sistema, permitindo uma comparação justa entre diferentes tecnologias de isolamento.
As características de materiais como a Espuma Elastomérica Flexível (FEF) e os aerogéis, que incluem estruturas de célula fechada, ajuste por compressão, cobertura adesiva total, hidrofobicidade e redução do espaço anular, comprovadamente atuam na redução da propagação da CUI. Além da seleção de materiais apropriados, a gestão eficaz da CUI depende crucialmente da qualidade da aplicação, da qualificação da mão de obra, e de programas de inspeção e manutenção rigorosos e bem direcionados. Ao adotar essa visão holística, engenheiros podem fazer escolhas mais informadas sobre a seleção de materiais, identificar áreas vulneráveis e desenvolver estratégias de gestão da CUI que resultem em maior vida útil dos ativos e menor interrupção das operações.
Referências
ARMACELL. Corrosion Under Insulation: a holistic approach to insulation system design to reduce risk of CUI on industrial piping. [S.l.]: Armacell, 2019.